domingo, 27 de novembro de 2011

Marrom 4.3




Da última vez eram 43...

Não sei dizer se passaram dias, meses ou anos...
Parei de contar.
Parei de calcular.
Parei de especular.
Começo a examinar.

Levo pro chuveiro, apertada ao peito, a sacola de planos.
Ou seriam sonhos?
Medonhos?
Tristonhos?
Risonhos?
Agora enfadonhos!

No fundo, bem no fundo, há um girassol amarelo.
Era pra ser rosa!
Era pra ser bossa!
Era pra ser fossa!
Era pra ser joça!
Era pra ser troça!
Era pra ser prosa!

A velha sacola se desmancha, pano podre,
Esvai-se entre meus dedos:
Desfaz-se um sonho inteiro...
Despencam os ponteiros...
Agora é pesadelo:
A tinta pra cabelo,
O ralo, o chuveiro!

Olho atordoada para o rio
em tom castanho 4.3.
Arrasta os fragmentos
Da sacola, dos lamentos,
E também dos tais momentos...
Pois que sim, houve momentos,
Uns de contentamentos,
Mais de constrangimentos.

Eu cria cegamente no mundo cartesiano.
Ilusão de ótica!
Ilusão de ética!
Ilusão caótica!
Ilusão patética!
Ilusão compartimentada!

Na tão preciosa sacola
O mundo era plano,
Redondo o sonho,
Fugaz o direito,
Servil o dever.

Percebo a contragosto, nada estava organizado.
Não há perfeição,
Nem compartimentos,
Não há rimas,
Nem contrapontos,
Não há ritmo!

Entre tufos de cabelos tintos em marrom perfeito,
Marrom 4.3 – Chocolate profundo,
Avisto o girassol, em amarelo profuso,
Contraste combinado à cor que engana o mundo.

O girassol sussurra, depois fala, depois grita:
“A vida é essa inquietude,
Essas incertezas, essa mistura de tudo...
Dos sonhos e dos planos,
Do querer, do desistir,
Do ser e do devir.
É esse infinito de horas
Que a tinta nos teus cabelos
Esconde do mundo inteiro,
Mas, não da tua alma.”

“Que desperdício!”,
Penso,
Enquanto morrem os contrastes,
Enquanto a chuva de água e de lágrimas
Cai, torrencialmente, sobre tudo...
Enquanto isto, penso, sobretudo,
Nas canções que não vou tocar,
Nos livros que não vou ler,
Nas bocas que não vou beijar,
Nas flores que não vou ver,
Nas chuvas que não vou tomar,
Nos amores que não vou ter,
Nas coisas que não vou realizar,
Penso, sobretudo, sobre tudo.

Da última vez eram 43...
Não sei dizer se passaram dias, meses ou anos...
Carrego pro chuveiro, apertada ao peito, a sacola de planos.
No fundo, bem no fundo, há um girassol amarelo.
A velha sacola se desmancha, podre pano, olho atordoada para o rio de tom castanho.
Eu cria cegamente no mundo cartesiano.
Na tão preciosa sacola percebo a contragosto, nada estava organizado.
Entre tufos de cabelo tintos em marrom perfeito, o girassol sussurra, depois fala, depois grita:
 “Que desperdício!”




7 comentários:

Mário Gerson disse...

Lindo poema!
"Da última vez eram 43...
Não sei dizer se passaram dias, meses ou anos...
Carrego pro chuveiro, apertada ao peito, a sacola de planos."

Versos maravilhosos. Parabéns!

Anônimo disse...

Mara é sensibilíssima, uma honra, uma admiração que só o sorriso dela possa recriar.

Plínio Alexandre dos Santos Caetano disse...

Mara, sua sensibilidade no enredo é extremamente envolvente... a trama psicológica nos suga, fico feliz de fazer parte, junto de ti e de nossos colegas deste delicioso espaço!

Anônimo disse...

Mara, uma honra estar ao lado de uma escritora da sua grandeza. De verdade! Sua escrita e rica! Beijo!
Lai Paiva

Alessandro disse...

Pergunto a mim mesmo se há desperdício, quando leio uma poesia assim.

Afinal, também somos feitos dos atos que não realizamos. E você conta com os que realizou e os que apenas foram cogitados para chegar ao marrom 4.3. Para chegar a este poema.

Poema belíssimo, sem dúvida.

Beijo, Mara! :)

Coletivo Revolucionário disse...

Marapalavra sem desperdício

Toninho Araújo

Mara Medeiros disse...

Queridos Revolucionários, obrigada pela acolhida carinhosa.
Uma honra partilhar este espaço com vocês.
Carinho sempre.